And the Oscar goes to...

A 78ª edição dos Óscares trouxe consigo grandes "colisões". A primeira seria, desde logo, o facto de o polémico filme Brokeback Mountain - bloqueio sempre ao tentar pronunciar este título, no desespero de não parecer ridícula, um pouco como na lengalenga "um tigre, dois tigres, três trigres(?)" - ter sido nomeado para 8 Óscares, tratando-se de um filme que teve a coragem de retratar o amor entre duas pessoas do mesmo sexo, sem caricaturas, sem lantejoulas ou vozes efeminadas. Muito pelo contrário. O filme de Ang Lee (premiado este ano com o Óscar de Melhor Realizador) apropria-se de um cenário tipicamente "western" da América profunda, marcadamente másculo e machista, em que os papéis sexuais estão bem definidos, e aí edifica uma história de amor, tão válida como qualquer outra, mas trágica, porque impossível. Curiosamente, foi nessa mesma América da interioridade e do conservadorismo que o filme teve uma projecção inesperada, atingindo índices de bilheteira tremendos. "Eu sei que tu sabes que eu sei que tu sabes", a eterna questão...
Acho que nunca mais vou olhar para o John Wayne da mesma forma...
A segunda colisão foi o facto de, contrariamente às expectativas iniciais, o filme de Ang Lee não ter conseguido arrebatar os Óscares para que estava nomeado (ganhou 3 Óscares, ao invés de 8), colidindo de frente com "Crash". Colisão, de seu nome. Este filme interessante trata de outro tema controverso e pungente na sociedade americana: o racismo, mas não apenas o clássico confronto entre brancos e negros, mas todo o racismo que envolve asiáticos, árabes, latinos, etc e os estereótipos que se colam às pessoas, como se de uma sentença de morte anunciada se tratasse. O filme é composto por toda uma série de micro-histórias, de pequenos azulejos, que se vão encaixando num "puzzle" mais lato. O palco é Los Angeles, uma bomba relógio prestes a explodir, tal a dimensão avassaladora da tensão que consome os seus habitantes, em permanente rota de colisão. A banda sonora do filme é simplesmente perfeita, pois evoca a atmosfera de melancolia e de declarada ausência de esperança nesse cenário dantesco em que as pessoas já "não se tocam", como afirma, no início do filme, a personagem interpretada pelo magistral Don Cheadle (igualmente soberbo em Hotel Ruanda).
Não poderia deixar de mencionar o merecidíssimo Óscar atribuído a Philip Seymour Hoffmann pelo seu papel avassalador em Capote. Tal como disseram os críticos nova-iorquinos: "Só se a Terra for atingida por um meteorito é que Philip Seymour Hoffman não ganhará o Óscar de Melhor Actor". Para bem de todos, não fomos atingidos por qualquer meteorito e Philip Seymour Hoffmann ganhou o seu Óscar. Fomos atingidos, sim, pelo seu desempenho notável em Capote. As palavras afiguram-se irremediavelmente escassas para descrever o rol de sensações que a sua interpretação sobre-humana despertou. O livro de short stories do Capote está na mesinha-de-cabeceira, à minha espera...

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