Os tecidos de que se entretecem as memórias
Por vezes, é difícil destrinçar entre realidade e ficção. Por vezes, somos levados numa torrente de improbabilidade e absurdo que se torna quase impossível traçar a fronteira entre o que é real e o que é sonhado.
Ontem assisti à peça "Alices" da autoria da escritora norte-americana Susan Sontag, no Teatro Viriato. O título original é algo distinto: "In the bed" e, de facto, toda a peça se desenrola na cama, onde Alice se refugiara do mundo envolvente, vítima de uma "saúde trágica".
Qual Frida Kahlo aprisionada num imenso vale de lençóis, por onde entram e saem inúmeros personagens, imaginados, imaginários, reais e de carne e osso. Alice nunca fora suficientemente destemida para conseguir viver e fruir a vida, para se deixar percorrer pelo riso, pela alegria, pelo espírito pragmático e bem terra à terra. Nunca saíra da cama. Nunca estivera em Roma, apenas em pensamento e, no seu imaginário, traçava o itinerário completo, ouvia a multitude de sons da eterna Roma, cruzava-se com a multidão, sentia na pele imaginária a luz que Roma derrama.
As visitas de Alice vão-se alternando no quarto. Umas entram pelos lençóis, interpelando Alice, desafiando-a a evadir-se, outras, tais como o pai (demasiado centrado sobre si próprio para se aperceber da existência frágil de Alice, que formulava os seus juízos a priori sem que ela proferisse uma só palavra) ou o irmão protector que é condescendente com ela e que, ao invés de ouvir os seus apelos desesperados, a trata por "coraçãozinho".
São várias as "Alices" que vivem dentro de Alice, numa infinidade de espelhos em confronto. Há a Alice criança e já deprimida e consumida pelo desejo de suicídio,a Alice brilhante, com uma inteligência fora do comum, a Alice insegura, a Alice com desejos de mulher. Como se ela se desdobrasse em imensos heterónimos, à boa maneira pessoana!
A concepção do espectáculo é soberba: construíu-se uma cama que ocupa o palco - onde os espectadores se encontram - e há um lençol imenso por onde pululam os personagens de "Alice". A representação, absolutamente irrepreensível!
A doença é um lugar estranho...
Ontem assisti à peça "Alices" da autoria da escritora norte-americana Susan Sontag, no Teatro Viriato. O título original é algo distinto: "In the bed" e, de facto, toda a peça se desenrola na cama, onde Alice se refugiara do mundo envolvente, vítima de uma "saúde trágica".
Qual Frida Kahlo aprisionada num imenso vale de lençóis, por onde entram e saem inúmeros personagens, imaginados, imaginários, reais e de carne e osso. Alice nunca fora suficientemente destemida para conseguir viver e fruir a vida, para se deixar percorrer pelo riso, pela alegria, pelo espírito pragmático e bem terra à terra. Nunca saíra da cama. Nunca estivera em Roma, apenas em pensamento e, no seu imaginário, traçava o itinerário completo, ouvia a multitude de sons da eterna Roma, cruzava-se com a multidão, sentia na pele imaginária a luz que Roma derrama.
As visitas de Alice vão-se alternando no quarto. Umas entram pelos lençóis, interpelando Alice, desafiando-a a evadir-se, outras, tais como o pai (demasiado centrado sobre si próprio para se aperceber da existência frágil de Alice, que formulava os seus juízos a priori sem que ela proferisse uma só palavra) ou o irmão protector que é condescendente com ela e que, ao invés de ouvir os seus apelos desesperados, a trata por "coraçãozinho".
São várias as "Alices" que vivem dentro de Alice, numa infinidade de espelhos em confronto. Há a Alice criança e já deprimida e consumida pelo desejo de suicídio,a Alice brilhante, com uma inteligência fora do comum, a Alice insegura, a Alice com desejos de mulher. Como se ela se desdobrasse em imensos heterónimos, à boa maneira pessoana!
A concepção do espectáculo é soberba: construíu-se uma cama que ocupa o palco - onde os espectadores se encontram - e há um lençol imenso por onde pululam os personagens de "Alice". A representação, absolutamente irrepreensível!
A doença é um lugar estranho...
Comentários
Haverá, porventura, uma alice dessas em cada um de nós? Inclino-me para acreditar nisso!
Um beijo