Cidadania



























O Teatro Viriato já vem habituando os seus espectadores assíduos a uma programação bastante diversificada, onde várias vozes performativas se cruzam e interagem.
Ontem subiu ao palco - e com o espectáculo, o próprio público - o projecto Cidadania, a partir do texto homónimo de Mark Ravenhill, com encenação de Graham Pulleyn.
Antes de entrar no cerne temático desta peça altamente provocadora (mas não menos realista), parece-me importante destacar que Graham Pulleyn foi o fundador do Teatro Regional da Serra do Montemuro, onde permaneceu durante 12 anos, tornando-se depois encenador de jovens.
A peça Cidadania insere-se num projecto mais amplo denominado Panos, com génese em Inglaterra (Shell Connections do London National Theatre), e que envolve sete escolas do nosso país.
Desiludam-se aqueles que pensam que esta peça é escrita numa linguagem muito densa ou pesada. Cidadania é feita de jovens para jovens e, obviamente, para todos aqueles que se interessem pelo intrincado mundo da adolescência. Neste complexo universo, há uma infinidade de perguntas e um desejo tremendo de respostas, que nem sempre emergem.
Por outro lado, todos os protagonistas da peça - cópia fiel dos jovens reais, porque também eles jovens em demanda, assolados por perguntas sem resposta - são confrontados com a questão crucial da escolha e, sobretudo, com a difícil afirmação da individualidade no contexto de grupo. Os adolescentes, por norma, degladiam-se com o árduo dilema de serem autónomos, sem, no entanto, se demarcarem do grupo que os e se monitoriza, como um verdadeiro juiz implacável. A linha que separa a integração da desintegração é muito ténue.
A nota dominante desta peça é, sem dúvida, o humor e como, através dele, podemos problematizar questões tão importantes como a cidadania e o exercício das escolhas pessoais num contexto social. O uso do calão é constante, numa linguagem fidedigna que, inevitavelmente, desperta a gargalhada (no fundo, aquela sensação quase infantil de nos regozijarmos com as palavras proibidas). Os puffs têm muitos elementos fálicos e as palavras de ordem escritas no chão são percorridas também pelo sexo, a obsessão predilecta de qualquer adolescente.
Os contextos podem divergir de geração para geração. Os jovens de hoje em dia vivem num universo dominado pela tecnologia, pela Internet, pelo ritmo frenético que já é uma realidade nesta geração.
Ainda que a adolescência dos tempos actuais se componha de outros matizes que não os das gerações anteriores, o desejo de transgressão, de experienciar e de descobrir é exactamente o mesmo. E sempre assim foi desde os primórdios da Humanidade. É nesse período que se forma a personalidade e que se traçam as escolhas fundamentais da existência.
Haverá sempre dúvidas, hesitações, avanços, recuos. No fundo, a adolescência nunca deixa de fazer sentir a sua marca. As preocupações assumem outros contornos, mas a urgência da escolha mantém-se. E é dessa matéria-prima que se faz a cidadania.

Comentários

Anónimo disse…
Parabens a todos os actores pela coragem e profissionalismo em palco.

Um pai presente,

Jose Fraga Viegas

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