Fast Love

Será que o McDonald's destruiu o Amor?
Ontem fiquei perplexa, quase sem palavras, quando deparei com um casal de provecta idade, na praia, sentados nas rochas, irremediavelmente apaixonados.
Associei aquela bela imagem ao último romance de Gabriel García Márquez intitulado Memórias de minhas putas tristes que foi muito criticado por não ter o fôlego que é habitual na produção literária deste autor, enfim, à medida que os escritores avançam na idade, os críticos tornam-se ainda mais implacáveis e obviamente patéticos.
Pessoalmente, foi um livro que me comoveu imenso, pois retrata de forma magistral os devaneios amorosos de um velho que acreditava poder vencer a crueldade do tempo e entregar-se ao delírio dos prazeres carnais. Claro está que o tempo não perdoa, deixando marcas intransponíveis, no entanto é muito apaziguador saber que o Amor, o desejo, a paixão podem perdurar até ao último suspiro. Ocorre-me a cena final do romance O Amor nos tempos de cólera, em que Fermina Daza e Florentino Ariza passarão o resto das suas vidas num ferry que navegava de lá para cá, de cá para lá, docemente, ao sabor das águas cálidas e tranquilas do Caribe.
Mas o cenário hoje em dia é bem diferente. O Amor tem prazo de validade, creio que ainda mais curto do que o dos iogurtes. Qual o motivo? Qual a causa oculta que subjaz a tudo isto? Será da “macdonaldização” da vida, em que tudo deve ser consumido rapidamente, sem contemplações, sem mais um segundo a perder? Será o ritmo frenético que nos impõem que assim o dita? Terão todas as relações uma sentença de “morte anunciada”?
É certo também que, em tempos idos, as pessoas mantinham autênticas fachadas e encenavam vidas perfeitas, sabendo-se, no entanto, que todas as públicas virtudes escondem vícios privados! E isso é tão verdade hoje como o foi outrora.
No entanto, por mais que olhemos à nossa volta, já não existem Florentinos e Ferminas, nem pessoas como o casal que observei ontem na praia. Há apenas envolvimentos meteóricos, desesperados, fadados a um fim sobranceiro e inevitável.
Num romance de Kundera (para quando o Nobel?!), intitulado A Lentidão, o autor faz precisamente o contraponto entre a velocidade e a lentidão, entre a contemporaneidade e o passado. Outrora, os amantes sabiam apreciar e jogar com o carácter lânguido do tempo, que ia tecendo as complexas teias de que se faziam as relações. A época actual, por triste comparação, destacava-se pela absoluta voracidade, pelo fim do hedonismo e das subtilezas da paixão.
Hoje em dia, já não há lugar para subtilezas. Tudo é demasiado imediato para poder ser lentamente “degustado”. Só procuramos imagens, em vez de palavras, forma, em vez de conteúdo. Seremos, de facto, mais felizes assim?
“Estranha forma de vida”…

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